O
Dia da Consciência, Negra, data comemorada em 20 de novembro, é uma momento de reflexão
e balanços dos avanços e desafios que a comunidade negra, afro-brasileira vem
enfrentando ao longo do tempo. Atualmente mais de 1000 municípios já decretaram
o Dia da Consciência Negra como feriado.
A
data é uma homenagem ao líder quilombola mais emblemático de toda a História,
Zumbi dos Palmares, que se tornou símbolo da resistência negra contra a
escravidão no Brasil colonial ao liderar um grupo de resistência do Quilombo dos
Palmares, localizado em uma região que hoje pertence ao estado de Alagoas.
Quilombos
eram aldeias onde se refugiavam os escravos que
fugiam das fazendas e casas de família, que os tratavam de forma desumana. Essas comunidades eram formadas em
matas, nos sertões, de modo a ficarem o mais distante possível dos centros
econômicos. A regularização de territórios remanescentes de comunidades quilombolas é uma importante concretização das conquistas da comunidade afrodescendente no
Brasil.
Atualmente
o maior dilema das comunidades remanescentes de quilombos é a questão da
regularização fundiária. Para tratar deste assunto tivemos um conversa com a equipe da diretoria
de regularização fundiária do ITERJ – Instituto de Terras e Cartografia do
Estado do Rio de Janeiro. Fomos
recebidos para tratar deste tema de suma complexidade, pelo Sr.Luiz Cláudio, diretor de regularização
do ITERJ, pelo Dr. Valter Eliseu, defensor público de carreira e gerente de
regularização fundiária do ITERJ, e pelo historiador Carlos Pereira Jr.,
pesquisador do ITERJ.
Dr. Valter Eliseu |
No
inicio da conversa o Dr. Valter Eliseu fez uma importante reflexão sobre a
formação da propriedade da terra no Brasil e como isso resultou em uma exclusão dos Quilombolas da terra, diz o
seguinte: “ Em uma síntese muito
apertada: Em 1500 o descobrimento do Brasil. De 1500 ate 1822 o que vigorava era o regime das
cotações. A coroa dava as terras para as
pessoas que trabalhavam e para as pessoas que eram amigos da própria coroa. Em
1822 com a independência esse sistema,
chamado de sesmaria, foi extinto. Foi extinto e mudou o sistema jurídico
da formação da nossa propriedade. Acabaram as concessões e começou a vigorar o
sistema da ocupação, ou a invasão das terras no Brasil. Em 1850 foi criada a lei 601, a
chamada lei de terras, em que a terra ficou submetida a compra e venda. . Quem tinha acesso a terra? Eram essas
oligarquias, evidentemente. É um período que a historia chama de consagração da grilagem. Então as pessoas
ocupavam aquele canto da terra e depois dessa ocupação que eles tinham acesso
conseguiram registrar a terra. Por que a terra foi submetida a compra e
venda? Por que já se ensaiva na Europa a restrição ao tráfico de negros. Já
em 1850 a lei Euzébio de Queiroz já o restringia trafico, já era um indicio do declinio do
sistema escravagista. Temos em 1888 a
abolição deste sistema , e os negros, os quilombolas, os afrodescendentes, não
tinham mais acesso a terra por que a terra estava submetida a compra e venda
com essa lei 601 de 1850. Então houve nitidamente a transferência do cativo do
homem para a terra. Então hoje a gente
não tem que trabalhar a questão
quilombola não somente pela excelência da sua musicalidade, do jongo. Mas
também a questão quilombola como na sua essência, de nos vermos os negros nas
escolas, nas universidades. E, sobretudo, de nós vermos os remanescentes de
quilombo na terra. Que houve esse processo
de exclusão, que a própria formação da propriedade, se encobriu de
excluir o negro.”
O processo de viabilidade da regularização fundiária de um
quilombo passa por 17 etapas previstas no decreto 4.887 de 2003, que é um decreto constitucional que envolve o
INCRA, que fica delegado pelo Ministério de Desenvolvimento a Agrário para
cuidar dessa questão, e envolve também a Fundação Palmares. Decreto este que é
uma norma especial que regulamenta o artigo 68 da CF, que diz o seguinte “ Aos
remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é
reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhe os títulos
respectivos. Antigamente se exigia um laudo cientifico antropológico para que efetivamente
a comunidade fosse cadastrada como quilombola. Atualmente o processo se inicia
a partir de uma autodeclaração da comunidade como sendo remanescente quilombola.
Diretor Luiz Cláudio |
Hoje, dia 20 de novembro, foi a data escolhida para dar continuidade
ao projeto de estímulo de geração de renda dos quilombolas da região de Cabo
Frio. Mais especificamente em Preto Forro e Maria Romana, com a entrega de 17
equipamentos e implementos, buscando incentivar a agricultura de
aproximadamente 200 famílias que vivem nessas áreas. A viabilidade do projeto
se deu através de um convênio entre o ITERJ e o BNDES.
Pesquisador Carlos Pereira Jr. |
O reconhecimento das comunidades quilombolas é certamente um
importante passo para ao processo de auto-afirmação da sociedade brasileira,
com a valorização e reconhecimento da cultura negra para a formação da
identidade nacional. Pensando nisso, o pesquisador Carlos Pereira Jr conclui dizendo da importância do
reconhecimento dos quilombolas para a autoafirmação dos afrobrasileiros, ele
diz o seguinte: É a construção de uma sociedade plural. Que tem a pluralidade
como princípio. Por que essa pluralidade não e só o resgate dessa identidade
negra, mas a construção também dessa identidade. Entender que negros, mulheres, gays é uma
luta em comum que esta associada a construção da própria democracia. Cultura
democrática, pois a democracia é uma
cultura cotidiana.
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Por Julio Oliveira Amado / Fotos: Daniel Guimarães e Julio Amado
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